O
sol é para todos consegue ser uma obra clássica tanto na literatura quanto no
cinema. A importância do seu tema faz de ambos algo que merece ser lido e
assistido. E é uma pena ver que aquelas mentes opressoras da época ainda
existem e fazem parte do nosso convívio.
Livro
e filme falam sobre o preconceito vivido nos anos 30, no sul dos Estados Unidos,
e sobre a perspectiva de duas crianças cujo pai é um advogado que defende um homem
negro.
O
livro que no inglês chama-se To Kill a Mockingbird, foi lançado nos anos 60 e foi
escrito pela autora Harper Lee que faleceu no ano passado e tem esse como sua
maior obra, pois ela não lançou mais nenhuma outra, apenas a sequencia desse em
2015. Uma sequencia que não foi muito bem recebida, diferente de O Sol é para
todos que foi sucesso de publico e critica na época. Muitos dizem que por
desmistificar a figura tão correta de Atticus.
Atticus
é um advogado bastante respeitado na sua cidade e é um personagem bem a frente
de seu tempo. Por sua simplicidade e gentileza ele é criticado pela irmã que
vai morar com ele para “ajudar” na criação dos seus filhos. Para o desgosto das
crianças. Atticus é coerente com suas atitudes, trata a empregada negra Cal
como se fosse realmente da família, a dando toda liberdade para a criação de
seus filhos. Ela é como a mãe das crianças, até nas brigas, coisa que o
advogado também não interfere. Ele é paciente com os idosos, respeitador e
entende o jeito da filha quando ninguém entende (principalmente a tia) ele é o
que todos os cidadãos da época (e de hoje em dia também) deveriam ser, mas não
eram graças ao preconceito.
Os
filhos, Jem, que é o mais velho e Louise que é a mais nova, enfrentam os
insultos dos coleguinhas de escola por terem um pai que é “amiguinho” de negro.
Só porque ele era o advogado de um negro acusado de estuprar uma branca. Louise
também enfrenta preconceito por se comportar como um menino, já que usa roupas
masculinas e briga como homem. Pela sua convivência com homens ela acredita que
o que faz é normal, e é, o problema é que estamos falando de uma época onde a
mulher deveria ser a mais feminina possível e deveria treinar desde cedo para
ser dona de casa. Coisa que Louise odiava.
Toda
essa perspectiva de mundo pelos olhos das crianças, principalmente da menina, é
o que deixa a obra ainda melhor. O preconceito também é retratado na segunda
trama narrada que é o medo que as crianças tem de Boo Radley, um homem recluso
que as crianças tem como um verdadeiro monstro graças a descrição sobre ele
dada pelos adultos. No filme temos uma visão melhor da imaginação dessas
crianças que ainda conta com o amiguinho Dill.
O
filme é de 1963 e foi dirigido por Robert Mulligan que não tem outro filme de
peso em sua carreira. Atticus é interpretado pelo galã da época Gregory Peck de
A princesa e o Plebeu, e tem aqui uma excelente atuação. Ele consegue
transpassar perfeitamente a serenidade e a bondade do personagem, assim como
sua astucia no tribunal. As crianças interpretadas por Mary Badham e Phillip
Alford também estão ótimas. Outro que está muito bem é o ator Brock Peters que
interpreta o acusado Tom Robinson, sua expressão passa o desespero disfarçado
de calma brilhantemente. A cena em que ele se defende no tribunal é excelente e
sua falta de esperança graças ao contexto histórico da época é devastador.
Quem
está em um papel pequeno, mas hoje é um dos maiores atores vivos é Robert
Duvall, que fez filmes clássicos como O Poderoso chefão e apocalipse Now, e
nesse clássico ele faz Arthur Radley, o Boo, um personagem tão temido pelas
crianças quando na verdade era um doce cãozinho assustado.
O
filme é extremamente fiel ao livro, mesmo não tendo algumas cenas que no livro
são essenciais para aprofundar o machismo com Louise. Mas no geral ele
transmite bem o sentimento melancólico das situações vividas naquela sociedade.
O final principalmente, a escuridão que somos imersos no livro (uma escuridão
que acontece realmente em uma floresta, mas também no sentimento retratado) é
bem adaptada no filme. E pelo filme ser em preto e branco essa cena poderia ter
ficado muito ruim, mas não isso não acontece.
O
Sol é para todos é um livro/ filme que retrata as coisas ruins de uma época através
do olhar inocente e questionador de uma criança. Além de trabalhar com a ambiguidade
já que vemos ser exposto os dois lados do ser humano, tanto o inocente quanto o
culpado. O final de Tom pode abrir duvidas para o questionamento de sua
inocência, ou pode apenas retratar o desespero de um pai de família cujo
destino já havia sido selado, mesmo antes de seu julgamento, e tudo por causa
da sua cor da pele.
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