sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

Review Livro e filme As Vantagens de ser invisível


          Com As vantagens de ser invisível eu fiz o caminho inverso, assisti ao filme em 2012 e só esse ano surgiu interesse em ler o livro, mesmo gostado bastante do filme. Há algumas diferenças entre ambos, mas essencialmente os dois falam com profundidade sobre a depressão na adolescência, e apesar do peso do assunto, a inocência do protagonista traz uma leveza em relação ao que ele está sentindo. O livro é uma das melhores leituras que fiz esse ano e se torna essencial para os adolescentes na faixa etária de Charlie.
          Um jovem solitário faz amizade com dois irmãos e começa a viver novas experiências, mas certos momentos trazem a tona traumas do seu passado.

         Vou tentar ao máximo não comparar o livro com o filme, pois todos sabem que uma adaptação não precisa ser idêntica a historia original para ser boa, muitas vezes as modificações dão muito certo e isso é o que acontece aqui. Não há aquela cena da “dança estranha” no baile porque no livro há várias festas e essa cena é uma junção de partes desses bailes e uma balada aonde Charlie vai com Sam e Patrick. A cena do túnel é bem fiel, a única diferença é a musica tocada no momento. Outra cena crucial é o surto de Charlie no final, que no filme acontece de forma diferente, mas os dois trazem cenas pesadas desse momento tão importante.
            Algo muito sério acontece com a irmã de Charlie, a Candance (que não é a agressão do namorado), mas essa coisa não é mostrada no filme. Assim como o maior trauma do passado de Charlie, que seria algo extremamente pesado para ser abordado em um filme adolescente com a Hermione de Harry Potter e o Percy de Percy Jackson.

            O trauma de seu amigo Michael ter se suicidado também culmina no fechamento que Charlie tem em relação ao mundo. O que se junta à morte de sua tia, morte que ele acha ser o culpado. A impressão é que o mundo conspira para o sofrimento do menino. Ele passou por muitas coisas que o quebraram por dentro e é incrível como mesmo assim ele continua acreditando nas pessoas e tendo esperança. Ele é um solitário que não quer ser solitário, que quer ter amigos (mais especificamente um melhor amigo) e quer que as pessoas retribuam a dedicação e o carinho que ele tem por elas, mesmo que ele não cite isso e que não peça nada em troca. 


          Sua inteligência e bom gosto também torna o personagem instigante. Sua playlist e sua lista de livros e filmes são indicações tão valiosas, que é primordial ter um caderninho ao lado quando for ler esse livro, para o leitor ir anotando as dicas. E ouvir, ler, assistir e sentir tudo que o personagem sente e passar a enxergar o mundo através de seus olhos, seu otimismo e sua força de vontade.
       A leitura é simples, intimista e deliciosa. São cartas escritas pelo Charlie para um determinado personagem, o ano é 1991, e esse “diário” é escrito ao longo desse ano como forma de terapia. Sam e Patrick são personagens adoráveis e gentis com Charlie, a amizade dos três é o ponto alto da narrativa (mesmo que eu esperasse ter muito mais desses momentos) os pais dele são pais comuns e a irmã (personagem mais ativa e importante no livro do que no filme) também é a típica irmã implicante, mas cada um deles (mesmo o irmão mais velho dele) tem suas próprias historias de vida que os enriquecem. O professor que indica os livros para Charlie também tem papel importante. Ele é aquele professor que toda pessoa apaixonada por leitura gostaria de ter, que indica obras fundamentais e debate sobre elas, ele dá importância para a opinião de Charlie, mesmo que ele seja apenas um adolescente, porém ele acredita na capacidade de interpretação do menino e ele tira sim mensagens incríveis de cada livro.
           Assim como Charlie, queremos ser infinitos, mesmo em nossa finitude. Queremos estar com pessoas e sentir coisas que nos tornem únicos. Queremos estar bem conosco e aproveitar ao máximo as belezas que só nossa solidão e nós mesmos podemos nos proporcionar. Ele é como você e eu.



SPOILER:

Quando assisti ao filme não tinha reparado na questão do abuso que Charlie sofria pela sua tia, por isso essa revelação no final foi uma coisa nova, e que me deixou muito impactada, mas só aumentou o meu carinho pelo Charlie, pois ele é um menino muito bom, mesmo com todos os seus traumas. Como ele poderia amar uma pessoa que fez tão mal a ele? E como imaginar que isso acontecia já que ele idolatra essa tia? O curioso é ver que toda essa devoção a ela parecia estar mascarando o sentimento ruim que estava adormecido nele, ele não se lembrava de que tinha sofrido abuso, mas quando Sam tenta tirar a roupa dele (fazendo os mesmos movimentos que sua tia fez um dia) ele se lembrou, aquele foi seu gatilho. Talvez a depressão funcione dessa forma para algumas pessoas, em coisas que elas querem esquecer e por isso guardam essas coisas em pequenas gavetas dentro da própria cabeça, mas quando algo que desperta a lembrança acontece, aquilo vem à tona como um furacão e acaba com a pessoa. Por isso ele queria tanto alguém em quem pudesse confiar, porque as pessoas sempre o decepcionavam, seja através de um abuso ou de uma morte, ele achava que não era suficiente pra ninguém ou que não era digno de ninguém e isso desencadeou sua depressão, que o filme trata de forma oculta e com muita delicadeza, mesmo que saibamos que está lá. Primeiro a tia o estupra, depois o amigo se suicida, só coisas ruins acontecem com ele e ele continua sendo um ótimo menino, o que me fez lembrar-se da Hanna Baker de Os treze porquês. Esse perfil de pessoa excelente que não é apreciada é muito presente em livros, filmes e séries sobre pessoas com depressão, pena que Hanna não teve amigos que a notaram a tempo, como aconteceu com Charlie.

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