Fazia
tempo que não se via um filme tão bizarro assim, com uma premissa tão diferente
e que usa elementos como “peidos” para criar metáforas. Esqueça tudo que você
já assistiu e assista aqui (no caso na Netflix, pois já está disponível lá) a
um filme que apesar da infantilidade (sentido perjorativo da palavra) é
totalmente inovador e que diverte.
Em
Um cadáver para sobreviver Paul Dano é Hank um homem perdido numa ilha e que
está prestes a se suicidar, mas encontra um cadáver que vai mostrando ter
habilidades especiais e ele o usa para sobreviver e voltar para a casa.
Bom,
essa é a sinopse, mas o filme toma seu próprio rumo e se mostra diferente do
que foi vendido. Quem dirige esse filme são os novatos irmãos “Daniels” Dan
Kwan e Daniel Scheinert e eles disseram em uma entrevista que esse filme é uma
mistura de tudo que eles odeiam, Como filmes com flatulências e filmes
musicais. E com genialidade eles conseguem criticar esses elementos e ao mesmo
tempo subverter eles.
Em
um dos pensamentos do cadáver ele diz “Se meu melhor amigo esconde os puns de
mim, o que mais ele está escondendo de mim?” esse não é o melhor dialogo para
ilustrar as famigeradas metáforas com peidos, na verdade esse é um dos diálogos
idiotas presentes no filme e ele tem sim alguns, assim como algumas falas clichês
também, mas ai depois desse pensamento contemporâneo ele acrescenta “e por que
esse pensamento me faz se sentir tão solitário? Como você esconde seus
pensamentos? E por que temos que esconder tudo?” E é aqui que o roteiro quer
chegar. Os puns são apenas uma ponte para reflexões mais profundas, são
catalisadores utilizados para que todos entendam o que os diretores (que também
são os roteiristas) querem transmitir.
Diferente
de filmes pastelões que utilizam os peidos como humor (e muitas vezes falham
nisso) esse o usa como metáfora para a solidão, aceitação e enfrentamento dos
problemas, os tornando no fim de tudo uma coisa natural e boa para o ser
humano. O que mostra o quão promissores são esses irmãos.
O
ódio aos musicais (sério, como alguém consegue odiar musicais?) é explicitado
nas cenas em que há introdução de musicas em momentos inoportunos, como temos
que admitir que acontece na maioria dos musicais. E também em como Hank se
irrita quando Manny,o cadáver, começa a emitir sons, ao mesmo tempo que os dois
começam a cantarolar quando não deveriam. A critica aos musicais aqui é aceita
até pelas pessoas que amam musicais, assim como eu, mesmo que eu ache
superficial demais rotular o gênero musical dessa forma, o diminuindo a apenas
essa característica quando na verdade os musicais são muito mais do que apenas
cantar e dançar em momentos errados.
As
atuações dos protagonistas são um deleite. Paul Dano é um ator que o grande
publico não conhece, só os cinéfilos mesmo, e desde sempre ele faz papeis de
caras estranhos em filmes pequenos, só que na maioria filmes bons e essa
escolha pessoal dele só aprimora ainda mais sua atuação, o que é evidente nesse
filme já que ele está excelente. Quem parece querer trilhar esse caminho também
é seu companheiro de filme e amigo morto interpretado pelo Daniel Radcliffe que
é conhecido mundialmente como o Harry Potter, mas que depois que se encerrou o
projeto vem fazendo filmes menores e alguns muito bons, mesmo quando são
comédias bobinhas. Em sua atuação ele é bem limitado, sempre foi, mas está
fazendo a escola Paul Dano e se aprimorando, tanto que esse é seu melhor
desempenho até agora, mas não pensem que interpretar um cadáver é fácil, dar expressão
e vivacidade a algo que está morto é uma tarefa árdua, mas ele conseguiu.
Uma
das melhores coisas do filme é a relação construída entre seus protagonistas,
uma amiga que assistiu ao filme disse: “Eu acabei de ver um bromance de
necrofilia?” e ficou dividida entre amar e odiar o filme, o achou ridículo e constrangedor,
mas gostou e disse que valeu a experiência e é isso que esse filme trás, o
desconforto e o sorriso na mesma proporção, assim como nas cenas dramáticas
onde há sentimentalismo e existencialismo dentro de cenas e diálogos nonsense.
O final é bem ambíguo, não se sabe o que realmente aconteceu, pessoalmente acho
que o cadáver nunca existiu, ou se existiu era apenas um cadáver qualquer, e
hank se apegou a ele, pois ele era uma versão dele mesmo, que estava morto por
dentro e só queria uma companhia, alguém que o amasse.
Para
assistir Um cadáver para sobreviver é preciso mente aberta, não desanime por
causa da sequencia inicial como vi muitas pessoas nos comentários na Netflix,
talvez você o odeie, mas feliz é quem abraçou a ideia do filme e mesmo em seu desconforto
admitiu a coragem dele. Além dos peidos já destrinchados anteriormente também
há ereção, e elas servem como uma bússola que aponta para Sarah, o crush de
Hank, usar o penis como analogia para o romance inalcançável, além dos diálogos
comparando a sensação da masturbação com outras sensações boas que o ser humano
tem é a prova de como a mente criativa dos irmãos “Daniels” funciona. Esse
filme tem ótimas atuações, metáforas com coisas fisiológicas tratadas com nojo
pela sociedade, um bom roteiro, uma boa edição (mesmo nos flashbacks malucos)
boa direção e a mensagem de que o ser humano só quer amar e ser amado quer se
apegar a algo ou alguém. E para Hank um personagem solitário e com graves problemas
psicológicos houve a necessidade de um cadáver lhe mostrar o que é viver.
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